sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

MANHÃ DE NATAL

Inspirado no soneto "Noite de Natal" de João Henriques da Silva.

É manhã de Natal! Silêncio treina
após a trápala da noite imensa...
O que há agora como recompensa?
Uma falsa paz que na terra reina!

É manhã de Natal! O fogo queima o
coração dos homens de forma intensa,
pela prática dessa vil ofensa,
que o homem todo ano pensa, tenta, teima!

É manhã de Natal! Nasceu Jesus
revestido de amor, paz, brilho, luz...
Numa pequena manjedoura em Belém.

É manhã de Natal! Em toda parte,
o presépio é representado co' arte!
Mas ninguém compreende nada! Ninguém!

Miguel de Souza

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

CURIOSIDADE LITERÁRIA

Na crônica “Dívida para com o Peixe Vivo”, do livro Andorinha, Andorinha, Bandeira conta como o poema “A Estrela” surgiu a partir da canção popular Peixe Vivo, uma das preferidas do presidente Juscelino Kubitschek: “Como pode o peixe vivo/Viver fora da água fria/Como poderei viver/Sem a tua companhia”. E Bandeira continua: “Letra e toada são lindas. Creio não exagerar dizendo que considero a divulgação do Peixe vivo como um dos maiores serviços prestados ao Brasil pelo presidente Juscelino. A primeira vez que ouvi cantá-lo foi na casa do meu saudoso primo José Cláudio. Pedro Nava atuou como corifeu e me lembro que Vinicius de Moraes estava presente; cada um de nós teve de improvisar sua quadrinha. Nava cantou: ‘Nas areias de Loanda/Dirceu chora noite e dia/Desde que sentiu perdida/ Tua doce companhia”. Vinicius secundou: “A minha alma chorou tanto/Que de pranto está vazia/Desde que eu fiquei sozinho/Sem a tua companhia”. Depois foi a minha vez e eu desafinei: ‘Vi uma estrela tão alta!/Vi uma estrela tão fria!/Estrela, por que me deixas/Sem a tua companhia”. Imediatamente entrei em transe e os dois primeiros versos da quadra germinaram posteriormente no poeminha “A Estrela”, que figura na Lira dos Cinquent’Anos e é dos que me inspiram maior ternura de pai. A célula do Peixe vivo está visível na terceira estrofe: “Por que da sua distância/Para minha companhia/Não baixava aquela estrela?/Por que tão alto luzia?”.




 A ESTRELA

Vi uma estrela tão alta.
Vi uma estrela tão fria!
Vi uma estrela luzindo
Na minha vida vazia.

Era uma estrela tão alta!
Era uma estrela tão fria!
Era uma estrela tão sozinha
Luzindo no fim do dia.

E ouvi-a na sombra funda
Responder que assim fazia
Para dar uma esperança
Mais triste ao fim do dia.

               Manuel Bandeira





domingo, 13 de dezembro de 2015

INTERAÇÃO

Uma interação feita na página da grande Poeta Rose Galvão, no Recanto das Letras. Assim que terminei a leitura do soneto, compus: "Em Estado de Poesia", por ter gostado muito do poema da Rose.
Obrigado pela publicação no Recanto.

                                     ################**************#################

Agradecendo a lindíssima interação do poeta Miguel de Souza. Obrigada Mil vezes poeta! Muito lindo!

EM ESTADO DE POESIA

Invade-me este seio a dor que agora,
vem e me abala feito um choque forte;
a deixar-me adjacente à própria morte,
e só termina quando fores embora!

Quando sumires pela vida em fora,
e tomares assim teu rumo norte,
e, com isto, sarares este corte,
pela tua ausência aqui nesta hora!

Enquanto não... A vida é um tormento,
pela tua presença em todo momento,
nas horas infindáveis do meu dia!

Sofro de angústia por ver-te, donzela:
tão linda, e meiga, e gata e toda bela!
Em pleno estado de poesia!


terça-feira, 8 de dezembro de 2015

SENHORA DA CONCEIÇÃO














Toda vez que, ao passar defronte à praça,
Contemplo aquela imagem sempre linda,
Da Santa envolta em luz, na berlinda...
A abençoar, quem por ali, sempre passa.

A Vossa imagem cheia de brilho, graça;
Há de continuar pra todo o sempre ainda,
Abençoando de maneira infinda,
Essa gente, esse povo e toda essa raça!

Toda vez que, ao passar no 609,
A imagem dessa Santa me comove,
E contemplo-A com fé e devoção...

Porque sei que também sou abençoado,
E que Jesus atende ao Vosso rogado, Oh,
Virgem Senhora da Conceição.

                                        Miguel de Souza

domingo, 29 de novembro de 2015

MAXIMÍNIMAS

SONETOS SOBRE AFORISMOS 

                                 Corrupção é a alma do negócio.                                                                                            Dori Carvalho                                                  
XX.

Na calada da noite, quando em ócio,
Mentes sórdidas agem no atro vil,
Larápios passam a mão no Brasil,
E, tramando no escuro, com seus sócios,

Vão lucrando com ótimos negócios,        
Deixando a populaça em frente ao rio,
Plantado nesse cais a ver navios!
Esta é a sina de todo capadócio!

E, por falar em corrupção, a propósito;
O Brasil, na verdade, é um depósito
De bandidos, ladrões, estrupadores...

Tudo porque no início da história,
Se não me falha a frágil memória,
Exilaram pra cá esses malfeitores!

                              Miguel de Souza


terça-feira, 24 de novembro de 2015

MOTE E GLOSA

Glosa é um tipo de poema utilizado normalmente pelos poetas do nordeste do Brasil, principalmente os cantadores. São estrofes de dez sílabas métricas conhecidas como décima que respondem a um mote. A décima é composta em redondilha maior ou versos de dez sílabas métricas.

 Mote é geralmente um dístico que funciona como se fosse uma epígrafe, e é a razão do poema. O tema desenvolvido pelo glosador. 


               MOTE
Pior que o peso da idade,
É a terra em cima da gente.                           
                
               GLOSA
Quando jovem não se pensa,
Que um dia a gente morre!
Só se brinca, pula e corre,
Essa é nossa recompensa.
... Quando a vida fica densa,
E a juventude se sente,
Ficar da gente ausente,
No fim dessa mocidade...
Pior que o peso da idade,
É a terra em cima da gente.

Mote do poeta Zé Saldanha, glosado por Miguel de Souza.

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

19 DE NOVEMBRO, DIA DA BANDEIRA

                                                               

                                                         Verde, amarela, azul, branca
                                                         Tremula no ar, a bandeira!
                                                         Com cores vivas, alegres, francas:
                                                          "Símbolo da nação brasileira."

                                                                     Miguel de Souza

sábado, 14 de novembro de 2015

CURIOSIDADE LITERÁRIA

Acho que os melhores poetas são os poetas repentistas. Aqueles que criam seus versos na hora, sem precisar de salamaleques ou firulas para compô-los. Não foi à toa que Manuel Bandeira se encantou por esses caras, e compôs o poema “Saudações aos cantadores” em homenagem a eles. Somente com o intuito de brincar, fiz o soneto “Pendenga com poeta popular”, que Dimas Batista, numa dessas coincidências extraordinárias, retrucou com uma décima. É claro que, ao fazer o soneto, não tinha o conhecimento da décima de Dimas, assim como Dimas, não conheceu o meu soneto. Mas ficou interessante, parece realmente que Dimas Batista, estava respondendo ao meu soneto com sua décima. Confiram!     

Pendenga com poeta popular

Joga teu verso no ar grande poeta,
Feito fumaça que se esvai qual vento!
Que eu grafarei pra sempre meu momento,
Mesmo se, para alguns, não for esteta.
Toca tua vida. E, de repente,
Teu repente flui como por encanto!
Que eu, sem pressa nenhuma, o meu canto
Vou construindo paulatinamente.
Faz teu verso perfeito, sem demora
E arranca da platéia teus aplausos,
Que eu darei um fim, pra sempre, nesse causo,
Pois, o meu verso fica, e o teu se evapora.
                O teu verso é como sombra esparsa,
                Que chega e parte sem nenhuma graça.

                                                   Miguel de Souza

Uma décima de improviso

Eu muito admiro o poeta da praça,
que passa dois anos fazendo um soneto,
depois de três meses acaba um quarteto,
com todo esse tempo inda fica sem graça.
Com tinta e papel o esboço ele traça,
contando nos dedos pra metrificar,
que noites de sono ele perde a estudar,
pra no fim mostrar tão minguado produto,
pois desses, eu faço dois, três, num minuto,
cantando galope na beira do mar.
* * *
                                           Dimas Batista

domingo, 8 de novembro de 2015

PARÓDIA


A paródia é uma recriação de textos, geralmente célebres, em tom burlesco, satírico, humorístico, contestador, crítico, irônico, jocoso.

O excelente soneto, “As quatro velas” de Dedé Monteiro, vem sendo homenageado pela criatividade de outros poetas. Eu também resolvi parodiá-lo com o meu “As quatro estrofes.

Texto-Base: As quatro velas

Quatro velas ardiam sobre a mesa,
E falavam da vida e tudo o mais.
A primeira, tristonha: “Eu sou a PAZ,
Mas o mundo não quer me ver acesa…”

A segunda, em soluços desiguais:
“Sou a FÉ! Mas é triste a minha empresa:
Nem de Deus se respeita a Realeza…
Sou supérflua, meu fogo se desfaz…”

A terceira sussurra, já sem cor:
“Estou triste também, eu sou o AMOR…
Mas perdi o fulgor como vocês…”

Foi a vez da ESPERANÇA – a quarta vela:
“Não desiste ninguém! A Vida é bela!
E acendeu novamente as outras três!

DEDÉ MONTEIRO


Paródias:

As quatro putas

Quatro putas falavam em um bar
Sobre a vida que era muito dura...
A primeira, cheinha de frescura,
Diz assim: “Eu vou me aposentar!

A segunda, morrendo de chorar,
Diz pra outra: “Ninguém mais me segura,
Tô com um metro e cinqüenta de altura
E a balança acabou de se quebrar.

A terceira, já com sessenta anos,
Disse às outras: “Restaram desenganos,
Ninguém mais quer três velhas prostitutas...

Veio a quarta, a que era cafetona,
E, lembrando dos tempos bons da zona,
Deu coragem de novo às outras putas.

Felipe Júnior


 Os quatro cornos

Quatro cornos sentados numa praça
Lamentavam por ter desilusões,
O primeiro lembrando as tradições:
- Eu me vingo das pontas na cachaça.

O segundo chorava de desgraça
E dizia: não perco as ilusões.
Se a mulher preferiu ter Ricardões
Isso é fase, mas sei que logo passa.

O terceiro chifrudo, o mais matreiro:
O que importa é a mulher trazer dinheiro
Pra o que falam de mim, nunca liguei.

Já o quarto cornão, foi taxativo:
- Quando a minha me trai sou vingativo,
Eu arranjo outro bofe e vou ser gay.

Ismael Gaião

 Os quatro bêbados

Quatro bêbados bebiam numa mesa,
E falavam da vida e tudo enfim,
O primeiro dizia: “Eu bebo assim,
Pra poder afogar minha tristeza”...

O segundo, engolindo uma de gim,
Diz: “a cana é quem faz minha defesa...
Se não fosse a bebida, essa beleza,
Minha vida seria muito ruim!

O terceiro, morrendo de ressaca,
Diz: eu sinto a matéria muito fraca,
Vou parar de beber essa semana!

Grita o outro: “não faça essa desgraça,
Mande abrir mais um litro de cachaça,
Que é pra gente morrer bebendo cana!”

Gonga Monteiro

 Os quatro poetas

O primeiro poeta com as velas
Deu um show de poesia, com certeza,
O segundo, num bar, ouve na mesa,
Depois narra, dos bêbados, as seqüelas.

Outro escuta, das putas, as mazelas,
Comentar sobre os ossos do ofício,
E, escutando dos cornos, o suplício,
Chega outro e relata tais procelas:

Como é dura a vida dos poetas,
No afã de cumprirem suas metas,
Desmanchando-se em versos, quem diria

Juntam: bêbados, cornos, velas, putas
Em estrofes bem simples, mas astutas
Transformaram isso tudo em poesia.

Carlos Aires


 As quatro estrofes
                                                                                                          
Quatro estrofes sondavam o poeta,
Pra fazerem parte desse soneto;
A primeira, como algo obsoleto,
Vislumbra-se de forma mui indiscreta!

A segunda, já com feições de esteta:
- Mente adentro do poeta me meto,
Mas vou fazer parte, isso eu prometo,
Pois, esta é que tem sido a minha meta!

A terceira atrai como se fosse ímã,
Para constar também naquela rima.
Mas foi mais uma para o descarte!

Foi a vez, enfim, da quarta estrofe,
Coxa, como quem tá botando os bofes,
Inselecionável a essa obra de arte!

Miguel de Souza


domingo, 1 de novembro de 2015

SOBRE LIVROS


 Um dos livros mais intrigantes da nossa literatura é "PARNASO DE ALÉM TÚMULO" (Poesias mediúnicas), primeiro livro psicografado por Francisco Cândido Xavier (Chico Xavier). Nele, encontramos poetas como Alberto de Oliveira, Alphonsus de Guimaraens, Antero de Quental, Antônio Nobre, Arthur Azevedo, Augusto dos Anjos, Auta de Souza, Casimiro de Abreu, Cruz e Sousa, Fagundes Varela, Guerra Junqueiro, Olavo Bilac, Raimundo Correia, entre outros.
       
       

 Francisco Cândido Xavier

Nasceu em Pedro Leopoldo, MG, em 2 de abril de 1910, onde residiu até dezembro de 1958. Transferiu-se para Uberaba, MG, em janeiro de 1959. Filho de João Cândido Xavier e de Maria João de Deus, desencarnados em 1960 e 1915, respectivamente. Aposentou-se como funcionário público federal. Médium de atividade ininterrupta há quase meio século, publicou através da Casa-Máter do Espiritismo - Federação Espírita Brasileira, em junho de 1932, o Parnaso de Além-Túmulo, primeiro livro de suas faculdades mediúnicas,seguiram-se-lhe mais de 110 livro mediúnicos, diversos deles publicados em Esperanto, Castelhano, Japonês, Inglês e Francês. Os romances psicografados (entre eles Paulo e Estêvão, há mais de dois mil anos... e Renúncia) são periodicamente radiofonizados e televisionados. Criatura simples, afável e operosa, jamais se beneficiou dos direitos autorais de sua vasta produção mediúnica. Respeitado e estimado em todo Brasil, onde é popularíssimo, goza ele ainda de sincera admiração em outros países. Viajou para o exterior algumas vezes, sempre no exercício de seu mediunato.

          DE PÉ, OS MORTOS!

          Pede-me você uma palavra para o intróito de "Parnaso do Além-Túmulo" que aparecerá brevemente em nova edição.
          A tarefa é difícil, Nas minhas atuais condições de vida tenho de destoar da opinião que já expendi nas contingências da carne.
          Os vivos do Além e os vivos da Terra não podem enxergar as coisas através de prismas idênticos. Imagine se o aparelho visual do homem fosse acometido segundo a potencialidade dos raios X: as cidades estariam povoadas de esqueletos, os campos se apresentariam como desertos, o mundo constituíram um conjunto de aspectos inverossímeis e inesperados.
         Cada esfera da vida está subordinada a certo determinismo, no domínio do conhecimento e da sensação.
          Decerto, os que receberem novamente o "Parnaso de Além-Túmulo" dirão mais ou menos o que eu disse (2). Hão de estranhar que os mortos prossigam com as mesmas tendências, tangendo os mesmos assuntos que aí constituíam a série de suas preocupações. Existem até os que reclamam contra a nossa liberdade. Desejariam que estivéssemos algemados nos tormentos do inferno, em recompensa dos nossos desequilíbrios no mundo, como se se nossos amargores, daí, nos bastassem para nos inclinar à verdade compassiva.
          Individualmente, é indubitável que possuímos no Além o reflexo das virtudes ou das nossas misérias.
          Mas é razoável que apareçamos no mundo, gritando como alucinados? Os habitantes do reino da morte ainda apreciam o decoro e a decência, e o nosso presente é sempre a experiência do passado e a esperança no futuro.
          "Parnaso de Além-Túmulo" sairá de novo, como a mensagem harmoniosa dos poeta que amaram e sofreram. Cármen Cinira aí está com os seus sonhos e desafios, de mulher e de menina, Casimiro com a sua sensibilidade infantil, Junqueiro com a sua ironia, Antero com a sua rima austera e dolorosa.
          Todos aí estão dentro das suas características.
          Os mortos falam e a Humanidade está ansiosa, aguardando a sua palavra.
          [...]
                                                                                       Humberto de Campos (*)
                                                                                                  (Espírito)


Reparem como Casimiro de Abreu não perdeu seu estro, e revela saudades do Brasil, no seu tempo encarnado na matéria.

Casimiro de Abreu

Poeta fluminense desencarnou aos 18 de outubro de 1860, na fazenda de Indaiaçu, no então município de Barra de São  João, hoje denominado Casimiro de Abreu, com 21 anos de idade, acometido de tuberculose pulmonar. Figura literária da mais típicas do seu tempo, o autor malogrado de "Primaveras" ainda aqui se afirma no seu profundo quão suave nativismo lírico. Suas composições possuem "um sabor estilo colorido, sensível e personalíssimo." disse Ronald de Carvalho.

À MINHA TERRA

Que terno sonho dourado
Das minhas horas fagueiras,
No recanto das palmeiras
Do meu querido Brasil!
A vida era um dia lindo
Num vergel cheio de flores,
Cheio de aroma e esplendores
Sob um céu primaveril.

A infância, um lago tranquilo
Onde começa a existência,
Onde os cisnes da inocência
Bebem o néctar do amor.
A mocidade era um hino
De melodias suaves,
Formadas de trinos de aves
E de perfumes de flor.

O dia, manhã ridente,
Numa canção de alvorada;
A noite toda estrelada
Após o doce arrebol;
E na paisagem querida,
Os ramos das laranjeiras
E das frondosas mangueiras
Douradas à luz do sol!

Oh! Que clarão dentro dalma,
Constantemente cismando,
O pensamento sonhando
E o coração a cantar,
Na delicada harmonia
Que nascia da beleza,
Do verde da natureza,
Do verde do lindo mar!

Oh! Que poema a existência
De infância e de mocidade,
De ternura e de saudade,
De tristeza e de prazer;
Igual a um canto sublime,
Como uma estrofe inspirada
Na noite e na madrugada,
Na tarde e no amanhecer.

De tudo me lembro e quanto!
A transparência dos lagos,
As carícias, os afagos
E os beijos de minha mãe!
Dos trinos dos pintassilgos,
Da melodia das fontes
As nuvens nos horizontes
Perdidos no azul do além.

Quando eu cruzava as campinas,
Sem sombras de sofrimento,
Descalço, com o peito ao vento,
Num tempo doce e feliz!
Os pessegueiros floridos,
As frondes cheias de amora,
O manto de luz da aurora,
Os pios das juritis!

Se a morte aniquila o corpo,
Não aniquila a lembrança;
Jamais se extingue a esperança,
Nunca se extingue o sonhar!
E à minha terra querida,
Recortada de palmeiras,
Espero em horas fagueiras
Um dia poder voltar.


 CRUZ E SOUZA
     
Catarinense. Funcionário público, encarnou em 1861 e desprendeu-se em 1898, no Estado de Minas. Poeta de emotividade delicada, soube, mercê de um simbolismo inconfundível, marcar sua individualidade literária. Sua vida foi só dores.

HERÓIS

Esses seres que passam pelas dores,
Às geenas do pranto acorrentados,
Aluviões de peitos sofredores,
No turbilhão dos grandes desgraçados;
                   
Corações a sangrar, ermos de amores,
Revestidos de acúleos acerados,
Nutrindo a luz dos sonhos superiores
Nos ideais maiores esfaimados;

Esses pobres que o mundo considera
Os humanos farrapos dos vencidos,
Prisioneiros da angústia e da quimera,

São os heróis das lutas torturantes,
Que são, sendo na Terra os esquecidos,
Coroados nas luzes deslumbrantes!

 AUGUSTO DOS ANJOS

     Paraibano. Nasceu em 1884 e desencarnou em1914, na cidade de Leopoldina, Minas. Era professor no colégio Pedro II .inconfundível pela bizzarria da técnica, bem como dos assuntos de sua predileção, deixou um só livro – Eu – que foi, aliás, suficiente para lhe dar personalidade original.

ALMA

Nos combates ciclópicos, titânicos,
Que eu às vezes na Terra empreendia,
Nos vastos campos da psicologia,
Buscava as almas, seres inorgânicos;

Nas lágrimas, nos risos e nos pânicos,
Nos distúrbios sutis da hipocondria,
Nas defectividades da estesia,
Nos instintos soezes e tirânicos.

Somente achava corpos na existência,
E o sangue em continuada efervescência
Com impulsos terríficos e tredos.

Enceguecido e louco então que eu era,
Que não via, dos astros à monera,
As luzes dalmas em trágicos segredos.

GRATIDÃO A LEOPOLDINA (*)

Sem o vulcão de dor de hórridas lavas,
Beija, Augusto, este solo generoso,
Que te guardou no seio carinhoso
O escafandro das células escravas.

Aqui, buscaste o campo de repouso,
Depois das vagas ríspidas e bravas
No mundo áspero e vão, que detestavas,
E onde sorveste o cálice amargoso.

Volta, Augusto, do pó que envolve as tumbas,
Proclama a vida além das catacumbas,
Nas maravilhas de seus resplendores.

Ajoelha-te e lembra o último abrigo,
Esquece o travo do tormento antigo
E oscula a destra de teus benfeitores.


_________
(*)
Poesia recebida em 18 de julho de 1940, em Leopoldina, onde foi sepultado o poeta.


domingo, 25 de outubro de 2015

CANÇÃO DA CHUVA

                                   Composto no celular

O tempo se prepara para o pranto:
Relâmpagos e suas setas no ar!
E o trovão, logo após, a indicar
a chegada da chuva com seu canto!

Longe de ser berceuse, acalanto;
ou aprazível canção de ninar...
O tempo se prepara para chorar,
com lágrimas e mágoas de quebranto!

O tempo chora, enfim, as suas mágoas,
jorrando sem cessar infindas águas,
sobre toda a superfície terrestre...

Causando, infelizmente, alguns transtornos,
mas, deixando na flora seus adornos,
e aquietando os pássaros silvestres.

                            Miguel de Souza

domingo, 18 de outubro de 2015

SONHO REALIZADO

O poema "Sonho de ser palhaço", surge a partir do meu sonho de ser humorista. Pois sempre tive loucura pelos humoristas. Amo todos eles. Mas como acho que não tenho competência, nem talento para tal, contento-me com a missão de ser poeta, o que não é pouca coisa. Afinal de contas, o poeta é um pouco de tudo, como diria a quadrinha popular.
O palhaço Espiga aparece no desfecho do poema quando é apresentado ao público. O fim do poema é o início do espetáculo! A partir daí, nasce esse personagem que ficou implícito por 17 anos. No recital do dia do poeta, em outubro de 2014, na Escola Estadual Francelina Dantas, o palhaço Espiga se materializa.
Foi uma noite mágica e inesquecível. Eu parecia outra pessoa, ou melhor, eu era outra pessoa, era o palhaço Espiga. Alvo de brincadeiras e palhaçadas, juntamente com o meu amigo-irmão, o poeta Edivan Rafael, que  fez a vez do palhaço Sabugo. Fomos protagonistas do melhor recital que já fizemos durante esse tempo todo em que estamos nessa jornada.
Tanto é, que na semana seguinte, voltamos à Escola Francelina Dantas, para uma homenagem em consequência do sucesso que foi. Nunca fui tão aplaudido na minha vida como naquela noite. Foram mais ou menos cinco minutos entre assobios e gritos de eles merecem! Um telão mostrou fotos em momentos outros quando estivemos por lá. Fiquei lisonjeado com a aluna lendo o soneto "O choro do palhaço" e o meu poema que criou asas, "As tintas da natureza".
Foi recapitulando aquela noite memorável que findei compondo o soneto, "Espiga, o palhaço". Existem burburinhos por aí de mais uma aparição do palhaço Espiga. Será?!


                                                           ESPIGA, O PALHAÇO.

                                                 Ah, que saudade do palhaço Espiga:
                                                 de sapatão, com sua roupa frouxa,
                                                 a rolar pelo chão, chamar de trouxa
                                                 o outro... e fazer rir de dar dor na barriga!

                                                 Ô, palhaço engraçado duma figa!
                                                 A enxotar a tristeza sempre chocha,
                                                 transformar em azuis, as horas roxas
                                                 das simpáticas crianças sem fadiga!

                                                 Com seu nariz vermelho, sempre chato...
                                                 Às crianças, jamais ele foi chato,
                                                 por trazer na cabeça exposto calvo.

                                                 E com mais de mil e uma palhaçadas,
                                                 a produzir trocentas gargalhadas!
                                                 No palco, das piadas, ele era o alvo!

                                                              Miguel de Souza

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

HOMENAGENS

DIA DA PADROEIRA, DAS CRIANÇAS E ANIVERSÁRIO DA FERNANDA.



                                       






A BÊNÇÃO


Venho neste soneto, a trouxe-mouxe,
pedir mais uma vez, oh, Mãe Senhora,
como tenho pedido a toda hora,
a bênção que Vós sempre me trouxe!

De olhar angelical, a feição doce,
abençoai minha Mãe, sem demora...
de ser abençoado, não vejo a hora,
por Vossa Santidade, qual se fosse

a bênção derramada sobre Jesus,
que padeceu por nós em uma cruz..
A bênção minha Mãe tão querida!

Abençoai esse pobre pecador,
a suplicar por uma nesga de amor,
abençoai, por fim, a minha vida!

                        Miguel de Souza


reminiscência

há uma rua em mim:
antiga rua
da minha infância...

rua nua de asfalto
onde um menino peralto
hoje, perdido na distância,
brincava feliz!

há uma rua em mim:

rua em que não há mais!
hoje, personagens são outros,
e aquele pacato garoto,
cheio de alegria e paz...
passa despercebido

pela rua, princípio de lua,
com sua veste preta,
com seus garotos outros,
num tempo outro.

mas há uma rua em mim:
vetusta rua
na minha memória...

onde um menino,
dono do seu destino,
escreveu sua história!

                     Miguel de Souza


E faz aniversário Fernanda Souza, universitária do curso de Administração na Esbam, noiva, prestes a casar. Só poderia mesmo ser uma pessoa tão iluminada para nascer numa data tão linda! Parabéns, e que Nosso Senhor Jesus Cristo continue te abençoando, amém!! Eis um soneto que fiz pra ti.





















HOJE

                                     Pra Fernanda Souza

Hoje, olho pra ela como se ontem fosse,
e vejo tudo! Menos a garota
de trajes simples, e de roupas rotas,
e de quem a tristeza tomou posse!

Hoje, sorriso aberto, largo, doce...
Na mulher tão menina quão marota,
onde toda a beleza não se poupa,
de revelar-se em sua face num close...

Cabelos ondulados, cor do sol,
pertencente a esta estirpe, grei, escol,
a menina-mulher a ornar a vida!

Hoje, o passado se faz presente
no futuro que vem pela frente,
das tuas horas tão bem vividas!

                      Miguel de Souza

domingo, 4 de outubro de 2015

SOBRE POEMAS


VIII

Recordo ainda... E nada mais me importa...
Aqueles dias de uma luz tão mansa
Que me deixavam sempre de lembrança,
Algum brinquedo novo à minha porta...

Mas veio um vento de desesperança
Soprando cinzas pela noite morta!
E eu pendurei na galharia torta
Todos os meus brinquedos de criança...

Estrada fora após, segui... Mas, ai,
Embora idade e senso eu aparente,
Não vos iluda o velho que aqui vai:

Eu quero os meus brinquedos novamente!
Sou um pobre menino... acreditai...
Que envelheceu, um dia, de repente!                                                        

Mário Quintana
A rua dos cataventos
P. 26


ALGUNS DIZERES

          O primeiro verso deste soneto: "Recordo ainda... E nada mais me importa...", já coloca em evidência o tema ao qual o poeta se propõe a cantar. Mas, não é somente isso. Não é à toa que o bardo usa reticência para dar ênfase ao seu pensamento, desdobrando dessa forma, o verso em dois momentos, para enfatizar com clareza a fase mais importante e marcante de sua vida. Os três versos seguintes vêm explicar de certa forma qual seria essa recordação do poeta. As palavras luz, mansa. lembrança, brinquedos são as chaves que denunciam o tema proposto.
          A antítese fica evidente no primeiro verso da quadra seguinte quando o poeta diz: "Mas veio um vento de desesperança", que também pode funcionar como metáfora de outra fase da vida, a adulta. Reparem bem que o tempo vai passando lentamente diante de nossos olhos na transposição de uma quadra para outra. O que seria esse vento de desesperança? O tempo? O segundo verso da segunda quadra: "Soprando cinzas pela noite morta", é o ofício do próprio tempo que encaminha o poeta para a velhice. Reparem que as palavras agora são outras, antônimas daquelas do princípio do poema: "desesperança, cinzas, morta". O terceiro e o quarto verso se completam: "E eu pendurei na galharia torta/Todos os meus brinquedos de criança...". A palavra galharia é um corpo estranho no decorrer do poema, talvez signifique o pensamento, a mente, a recordação do autor.
          O primeiro terceto aborda a chegada da velhice. "Estrada fora após segui... Mas, ai,". A palavra "ai" (onomatopeia de dor), não foi a última palavra a ser escrita à toa, ela está lá para evidenciar bem essa fase. Enfim, o poeta entrega aquilo que havia negado até aqui, a palavra velho, que é relatada neste terceto de forma clara e objetiva: "Não vos iluda o velho que aqui vai" (...)
          No desfecho do poema, Mário Quintana implora pela infância novamente, pedindo os seus brinquedos, aqueles que havia pendurado na galharia torta. E se queixa da passagem rápida do tempo: "Sou um pobre menino... Acreditai.../Que envelheceu, um dia, de repente!...


MUDANDO DE ASSUNTO

Se eu fosse um padre

Se eu fosse um padre, eu, nos meus sermões,
não falaria em Deus nem no Pecado,
- muito menos no Anjo Rebelado
e os encantos das suas seduções,

não citaria santos ou profetas:
nada das suas celestiais promessas
ou das suas terríveis maldições...
Se eu fosse um padre eu citaria os poetas,

rezaria seus versos, os mais belos,
desses que desde a infância me embalaram
e quem me dera que alguns fossem meus!

Porque a poesia purifica a alma
... e um belo poema - ainda que de Deus se aparte -
um belo poema sempre  leva a Deus!

Mário Quintana
In: Nova Antologia Poética
Editora Globo
P. 105.
  

sábado, 26 de setembro de 2015

CURIOSIDADE LITERÁRIA

ENSINAMENTO

Minha mãe achava estudo
a coisa mais fina do mundo.
Não é.
A coisa mais fina do mundo é o sentimento.
Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,
ela falou comigo:
"Coitado, até essa hora no serviço pesado."
Arrumou pão e café, deixou tacho no fogo com água quente.
Não me falou em amor.
Essa palavra de luxo.

Adélia Prado
In: Bagagem
P.:124

Um poema feito a lápis numa página em branco do livro "Bagagem" de Adélia Prado. Talvez algum poeta momentaneamente inspirado pelo poema "Ensinamento" escrito acima.

FOTOGRAFIA

Quando minha mãe posou
para este que foi seu único retrato,
mal consentiu em ler as têmporas curvas.
Contudo, um desejo de beleza em seu rosto
que uma doutrina dura fez contido.
A boca é conspícua,
mas as orelhas se mostram.
O vestido é preto e fechado.
O temor de Deus circunda seu semblante
como cadeia. Luminosa. Mas cadeia.
Seria um retrato triste
se não visse em seus olhos um jardim.
Não daqui. Mas jardim.

Anônimo.



segunda-feira, 21 de setembro de 2015

PESADELO


Naus antigas socorrem-me a mente,
vejo-me preso por grandes tentáculos,
não consigo sair desse obstáculo,
caem-me de uma vez todos os dentes!

Acordo-me cansado, o corpo quente...
Para mostrar o meu sustentáculo,
pego uma vela, dirijo-me ao oráculo,
e peço força e proteção d'algum ente

querido que passou para outro plano,
e que através de todos esses anos,
ficou com força, proteção e luz!

Então, posso enfim, dormir tranquilo,
como dormem na selva os esquilos,
e acordar como acordam todos os...

                              Miguel de Souza

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

16.02.1951 - 17.09.2015















PASSAGEM


Soube da tua passagem...
Aos sessenta e quatro anos,
viajaste a outro plano,
chegaste à terceira margem

como tantos, sem despedida!
Sem lenços e sem acenos,
com esse teu ar sereno,
porque foi assim tua vida!

Agora, dirás poemas
em vão, no vão desse nada,
nessa imensa madrugada
de sortilégios e dilemas.

E segues tirando sarro,
mestre Marcileudo Barros.

               Miguel de Souza



PS:. poema feito em razão do passamento deste grande artista. Poeta, humorista, prosador e algo mais! Segue em paz irmão.


segunda-feira, 14 de setembro de 2015

DESABAFO

Eu odeio todas as cercas...
Cercas que separam homens,
Cercas que separam destinos,
Cercas que separam almas...

Eu odeio todos os muros...
Muros que protegem os poderosos,
Muros que escondem felicidades,
Muros que isolam cidadãos de bem...

Eu odeio todas as leis...
Leis que esmagam os mais fracos,
Leis que alimentam a impunidade,
Leis que pendem apenas para um lado...

Eu odeio todos os homens...
Homens que fazem essas cercas,
Homens que constroem esses muros,
Homens que pregam essas leis.

Walterney Monteiro
In: Poetas da Folha / Coletânea Poética. Vol. 2
P. 6

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

SONETOS SOBRE O HINO NACIONAL



I.

Do sol da liberdade até agora,
não vi um raio sequer com o seu brilho,
a iluminar a estrada desses filhos,
da pátria amada idolatrada, embora,

enchem o peito da canção sonora, e
repetem com orgulho este estribilho!
Só tenho visto, até então, é empecilho,
a atravancar o nosso caminho, ora!

E o brado retumbante que ouviram,
Às margens plácidas do Ipiranga,
foram uns falsos guizos que feriram

nossos ouvidos, e ainda hoje ferem,
e, puseram no povo, velha canga,
pois manter-nos sob-rédeas, é o que preferem!


                                                                II.




                                                                Teu sonho intenso virou pesadelo
                                                                intacto com nenhuma vicissitude,
                                                                deverasmente parco e amiúde...
                                                                Do amor e da esperança sem podê-los,


                                                                ao menos, pôr os pés em escabelos...
                                                                olhar a imagem do cruzeiro pude!
                                                                Porque observar a imagem ilude,
                                                                e do espectador inflama todos pelos!

                                                                Se és belo, és forte, impávido colosso,
                                                                o teu povo, coitado, vive no osso,
                                                                num país rico, em plena pobreza!

                                                                E ainda dizem esta frase hostil:
                                                                Dos filhos deste solo és mãe gentil,
                                                                Oh, gigante pela própria natureza!


III.

Deitado eternamente neste berço,
estão poucos com seus privilégios.
E os que usufruem desse berço-régio,
da grande massa, não chega a 1/3.


Sou filho que olho, sofro e padeço,
por não ter ido, desde cedo, ao colégio.
Não faço parte desse sortilégio,
e nado contra o tempo, esse é meu preço.

Iluminado ao sol do novo mundo,
tua luz não ilumina meu futuro,
pois, com saúde, sinto-me moribundo!


Teus tristonhos, feios campos, não têm flores,
enquanto poucos muito ricos, eu duro!
Nesta vida, com receios, sem amores.

                                                                 IV.

                                                                  Brasil, cadê aquele amor eterno,
                                                                  do qual, com certeza, serias símbolo?
                                                                  E o lábaro que ostentas sempre terno,
                                                                  para onde foi com toda tua índole?

                                                                  E cadê o verde-louro desta flâmula?
                                                                  A paz do teu futuro? És subalterno!
                                                                  E a mensagem descrita no teu lábaro?
                                                                  Para onde foram teus homens supernos?

                                                                  Verás que um filho teu só foge à luta.
                                                                  Embora que, de sangue a farda borre,
                                                                  será o exemplo dessa vã conduta!

                                                                  Nem teme quem te adora essa vã sorte. 
                                                                  ao invés de socorrer... A ninguém socorre!
                                                                  E tomarás também teu rumo norte!

                                                                  Miguel de Souza